quarta-feira, 11 de março de 2009

Manual de Sobrevivência em Isahaya

Bem, como todos sabem, voltei ao Brasil, mas por pouco tempo. Dia 8 de abril tomo o avião em direção à China, desta vez a trabalho, sem previsão de volta definitiva. Mesmo assim, ainda devagar, continuarei a escrever sobre minhas viagens e aprendizagens. Ainda tenho o que contar sobre o Japão e não vou deixar de lado. No entanto, este artigo será dedicado aos próximos alunos intercambistas.

Falarei a respeito das dúvidas mais freqüentes para aqueles que participam do programa de intercâmbio oferecido pela UNIMEP. Os tópicos são: saúde, dinheiro, o curso, roupas, aeroportos, comida, compras, trabalho, lojas, transporte, o que levar / não levar, segurança, sexo, drogas, festivais e estações do ano.

Saúde em primeiro lugar. Não é necessário fazer um seguro aqui no Brasil. A Universidade Wesleyan de Nagasaki (NWU) dá aos intercambistas uma carteirinha com desconto caso você precise ir ao médico. No Japão não existe saúde gratuita como no Brasil. Claro, como tudo é caro por lá, o melhor é tentar não se machucar muito. Por uma radiografia de um dedo trincado, um amigo pagou por volta de 2 mil ienes, o equivalente a 20 dólares. Compensa levar remédios daqui: gripe, febre, dores etc.

Dinheiro é um problema aqui e em qualquer lugar do mundo. Com um cartão de crédito internacional, pode-se retirar uma grana no terceiro andar da loja de departamentos SEIYU. Cada saque tem um valor restrito de até 10 mil ienes, mas não há restrição de quantidade de saques. Além disso, a NWU oferece uma bolsa de 40 mil ienes mensais aos alunos brasileiros. O acordo é diferenciado entre os países, portanto, não espalhe a sua quantia aos colegas de quarto, caso forem gringos. Se preferir, fale com o Sr. Yamaguchi ou o Sr. Wakayama para abrir uma conta em um banco. As taxas são mínimas e dá pra guardar melhor o dinheiro - não por segurança de roubo, mas pra você mesmo não gastar suas economias. Um detalhe importante é que os japoneses não usam muito o cartão de crédito, portanto confira antes se é possível pagar ou não com o cartão, caso vá a alguma loja.

O curso, em si, é interessantíssimo! Você tem aulas de língua japonesa (gramática, vocabulário, audição, escrita e fala) através do livro Minna no Nihongo. As aulas de kanji são através do Basic Kanji, e provas de kanji em média 3 vezes por semana. De tarde tem-se aulas de cultura japonesa: ikebana, cerimônia do chá e caligrafia. Vale a pena ler a respeito dessas três aulas antes de começar a estudar, porque os professores só falam japonês, não medem o quanto você conhece do idioma e deixa a aula mais proveitosa. Cuidado com as faltas, eles são bem rígidos com isso! Veja direito, mas parece-me que são 9 horas/aula que você pode perder até a data da prova. Se você não passar de semestre, reprova e não consegue o certificado de conclusão do curso. E prepare-se desde o começo para o exame de proficiência em língua japonesa. É interessante e tem validade mundial!

As roupas japonesas são bem diferentes das nossas. A moda é muito bizarra e engraçada por lá. Parece que os japoneses olham para as peças individualmente, sem se importarem se vai combinar com o resto ou não. A menos que você seja extremamente vaidoso, não leve muita roupa. Pense no suficiente para 15 dias, pois lá tem máquina de lavar e secar gratuitamente. Para o final do curso, leve uma roupa formal, do tipo social mesmo, com terno, camisa branca, gravata e sapato.

Acredito que todos acabam fazendo uma parada no Aeroporto de Narita, em Tóquio. Se você continuar a viagem de avião, prepare-se com 3 mil ienes para pegar um ônibus que vai do Aeroporto de Narita até o Aeroporto de Haneda, também em Tóquio. A viagem demora cerca de 1 hora e meia. Há meios mais baratos e rápidos, como o trem. Mas é mais complexo pra quem acaba de chegar no Japão e tem que carregar a malas.

Quando voltei, todo mundo se espantou ao ver que engordei 3 quilos. A comida por lá vai de gosto, não tem como. Eu, particularmente, já gostava antes mesmo de ir. Há algumas sacadas pra poder economizar também. Vale a pena cozinhar, economiza-se muito. Na hora de comprar arroz, converse com o Sr. Romero, ele conhece um produtor local que vende um sacão de 30 quilos por um preço bem em conta. Quando comprar este saco, lembre-se de colocar um produto pra tirar a umidade e não juntar bicho. Esse tal produto pode ser comprado na SEIYU. Depois, inclusive, coloco algumas receitas básicas e bem legais por aqui. Prometo!

Fique atento às promoções dos três principais supermercados próximos da faculdade: ERENA, SEIYU e MARUTAKA. Pegue os jornais e veja qual está mais barato. Tem dias que o leite é mais barato em um, o pão mais barato em outro e aí por diante. Às sextas, dá pra comprar um rango pronto e bem legal no Marutaka. Tem um maki-zushi de tempurá de camarão bem gostoso lá. Quando for ao Erena, fique esperto na hora de comprar as verduras. Nesta seção, há dois extremos, o lado da porta e o lado dos peixes. O primeiro balcão de verduras do lado dos peixes contém somente as verduras produzidas na cidade, ou seja, são bem mais baratas. Ainda no Erena, de sábado e domingo tem carne em promoção, que, aliás, é uma coisa que você vai sentir muita falta (se não for vegetariano). Na seção de carnes, durante o final de semana, você pode comprar 3 pacotes por 999 ienes - claro, as carnes em promoção estão marcadas com um selo grande de 999 ienes, aí basta pegar 3 pacotes de carnes seladas, não necessariamente iguais. O SEIYU é o que tem o nome melhor, a mais variada gama de produtos, mas os preços mais elevados - exceto pela loja de 100 ienes, no quarto andar.

Trabalho no Japão, com o visto que teremos, só é permitido depois de 2 ou 3 meses de curso. Se algum fiscal te pegar trabalhando sem autorização, você é deportado e ainda paga multa alta. Quando for liberado o trampo, você tem primeiro que achar um serviço, depois pedir pro Wakayama ou o Yamaguchi tirar sua licença na prefeitura. É um tanto quanto difícil arrumar, uma vez que se concorre com os coreanos e chineses (das classes B e C), que falam um japonês bem mais legal que o seu. Dê um toque pro Mike, ele conhece um restaurante que sempre pega brasileiros quando precisa.

A grande dúvida quando se vai ao Japão é em relação aos preços de eletrônicos. De fato, comprar no Japão é mais barato do que comprar no Brasil. Mas não mais barato do que nos Estados Unidos. Portanto, se você pensa em comprar um computador por lá, veja primeiro se não tem alguém pra te trazer dos Estados Unidos. Aliás, levar um computador lá é imprescindível. A internet é gratuita e sem fio - às vezes cai a conexão, mas num geral é boa - e falar pelo skype é uma grande economia pra família que não tem acesso à internet. Comprar cartões telefônicos sai muito caro. Pra se ter uma idéia, dá pra falar cerca de 10 minutos com 2 reais no Skype. Sem contar que a segurança na faculdade é extremamente confiável. Enfim, se optar por comprar algo no Japão, pense em YAMADA DENKI (em Omura), BEST DENKI (em Isahaya) ou YODOBASHI CAMERA (em Fukuoka). Essas três redes estão espalhadas pelo Japão todo, mas estas são as lojas mais próximas da universidade. Procure saber sobre os cartões de fidelidade das lojas e supermercados, são gratuitos e dão bons descontos.

Para os estudantes intercambistas, transporte só não é um problema porque o transporte público é bem eficiente no Japão. Por conta da NWU ser responsável pelos alunos intercambistas, é proibido dirigir qualquer veículo motorizado. No entanto, bicicletas (ou “chari” na gíria japa) são um ótimo negócio. Dá pra usar umas bikes paradas no dormitório, basta falar com o Wakayama. Ou então, comprar uma usada por aí. Os trens também são muito eficazes. A JR tem algumas promoções durante as férias de verão, fique atento. Se você for muito pra alguma cidade, consulte os preços, sempre há um desconto. Os trens no Japão são classificados em 3 tipos básicos, o Local, o Normal e o Expresso. O Local pára em todas as estações, o Normal nas principais e de média importância, e o Expresso pára somente nas principais. Se comprar 6 passagens do Expresso pra Nagasaki, paga-se um preço de um Normal ou Local. O mesmo acontece com Fukuoka, mas são 4 passagens. Vale dizer que o preço do Normal e do Local é o mesmo, o que diferencia é o tipo do trem, apenas. E fique atento aos ônibus gratuitos que a faculdade oferece . A linha é sempre a mesma: da facul para a estação e vice-versa. Quebra um galhão pra descer pro centro!

Falando em transporte, assim que chegar no Japão, procure saber se as flores de cerejeira já floresceram e corra para Omura num final de semana. Entre o final de março e começo de abril, acontece o chamado “Ohanami” (contemplação das flores de cerejeira) no parque da cidade de Omura. Vale a pena! Durante o verão, os japoneses fazem muitos festivais, procure pelos de Nagasaki (inclusive peguei um Kiss cover ao vivo, grátis e a céu aberto) e cidades locais. É uma época de soltar bastante fogos-de-artifício, que são muito mais trabalhados do que os quais conhecemos aqui. Na verdade, eles chamam de “Hanabi” (flor-de-fogo) e levam bem a sério o nome. Aqui contamos pelo barulho e simultaneidade com que soltam os fogos, lá vale a apreciação e a beleza, mesmo que pareça um pouco parado demais pra gente no começo.

Falando em verão, a Terra do Sol Nascente tem uma marcação de estações do ano muito forte. Na primavera tudo é lindo, as flores são perfeitas e os passarinhos cantam Sonic Youth. O verão é a estação dos festivais, da chuva (no mês de junho chove todos os dias, o tempo todo) e dos bichos. Aranhas gigantes, minhocas, cobras, centopéias (venenosas) e outros animais gigantescos podem ser vistos em qualquer lugar do país - e o dormitório não escapa disso. Procure ir numa praia durante o verão! Gotô é um local bem bacana, por sinal. Além de uma piscina gratuita que tem a 30 minutos a pé da faculdade. Mas fique tranqüilo (sim, eu sou contra a reforma ortográfica!) que no outono a vida se estabiliza novamente. As folhas ficam vermelhas, laranjas e amarelas, e há um campo de “cosmos” lindíssimo pra se visitar (converse com o Go-san a respeito, ele manja o local). O inverno é monótono. Não tem Natal como aqui, o Ano Novo é comemorado diferente e todo mundo fica dentro do quarto porque é muito frio pra fora. Tudo bem, compre um uísque black label na SEIYU e passe a estação assim. Se for o caso, procure um lugar chamado SPOT, em Omura. É uma pizzaria de um americano chamado Brent. O cara é gente finíssima, louco de tudo e o preço é bem em conta. Fica bem pertinho da estação.

A segurança por lá é de se estranhar. Íamos para a SEIYU, comprávamos o mais barato e depois íamos para o Erena. Pra não carregar tudo pelo supermercado todo, colocávamos as sacolas da SEIYU numa mesinha dentro do Erena, fazíamos a compra sossegados, depois pegávamos tudo e voltávamos para o dormitório. Meu, fantástico isso! Sem contar que as ruas são todas adaptadas para deficientes visuais. Quando se abre o sinal para travessia de pedestre, o semáforo emite um sinal sonoro para os ceguinhos se guiarem. E em hipótese alguma você corre o risco de ser atropelado no Japão. Só se for muito tosco mesmo!

E é um país perfeito? Claro que não! Com o tempo você começa a perceber o que te incomoda por lá. Eu, particularmente, senti muita falta da diversão aqui do Brasil. Além, claro de poder conversar sobre história e política. O sistema educacional japonês, como dito num artigo anterior, é excelente quanto à estrutura física, mas peca muito em conteúdo e metodologia. Ficar com alguém no Japão é complicado. As japas, num geral, namoram e começam amando logo de cara. Não existe ficar. Ou é namoro ou amizade. E não pense que você vai sair para uma baladinha e encontrar várias colegiais à disposição, mesmo porque um rolê não sai por menos de 200 reais, jamais. E outra, elas não depilam as partes baixas! É... realmente este ponto pega firme. Ainda verá umas garotas da Mongólia com as axilas peludas! Uhul!!! Drogas? Nem pensar! Você vai ver bandeira de reggae e símbolo da maconha pendurado por todos os cantos, mas ninguém nunca viu nem conhece, só ouve falar.

Por fim, o que levar e o que não levar. Leve algum livro que queira ler, mas não ache que terá tempo de sobra pra ler milhões de livros. Estudar o idioma consome um tempo violento! DVDs e CDs vale a pena também. Copie ou passe seu arquivo para MP3 e leve junto. Secador de cabelo, remédios, maquiagem... eu não sei como funciona, mas na dúvida, leve. Sei que as tomadas são 110 volts. Caso você ande de skate, tem uma pista precária na cidade de Isahaya, no "Undou Koen" (Parque de Atividades Físicas), mas que dá pra tirar um rolê bacana. Violão? Se tiver, não esqueça! Me fez uma falta imensa!!! Não se preocupe com materiais escolares ou fitas dupla-face (para fazer o esquema do ar-condicionado) porque tudo se encontra na loja de 100 ienes (o nosso 1,99).

Acho importante comentar sobre a higienização do local. O dormitório masculino é meio toscão, meio podrão e abandonado. O das meninas é diferente. Os homens têm de limpar o banheiro, a sala de TV, a cozinha e tudo mais. Não espere mordomia, nem espere que montem um esquema de limpeza. Os coreanos, principalmente, parecem ser bem relaxados. Uma sugestão é montar uma tabela e conversar com o pessoal pra decidir quem limpa quando.

Este foi um manual breve do que se pode aproveitar de lá. Claro que há muito mais, depende de pesquisar e do gosto próprio. Qualquer coisa, perguntem.

Boa viagem!